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» Volume 72

Número suppl.3

http://dx.doi.org/

Internação e mortalidade por diabetes mellitus na infância: análise de séries temporais

RESUMO

Objetivo:

analisar a tendência das taxas de internação e mortalidade por Diabetes Mellitus em crianças e adolescentes no Brasil.

Método:

estudo de séries temporais, das taxas de internação e mortalidade por diabetes em crianças e adolescentes. Os dados foram obtidos do Sistema de Informações Hospitalares e do Sistema de Informações sobre Mortalidade, de 2005-2015, com análise realizada pela modelagem de regressão polinomial.

Resultados:

foram analisadas 87.100 internações e 1.120 óbitos por diabetes. As taxas de internações apresentaram aumento para ambos os sexos e todas as faixas etárias, com incremento para adolescentes entre 10-14 anos. A taxa de mortalidade apresentou queda, exceto para o grupo etário de 15-19 anos. À tendência da mortalidade geral no Brasil, as regiões Sul e Sudeste apresentaram decréscimo, enquanto que para as internações, apenas a região Centro-Oeste permaneceu constante, enquanto as demais aumentaram.

Conclusão:

ocorreu decréscimo da mortalidade na infância, porém, com aumento das internações.

Descritores:
Diabetes Mellitus; Criança; Adolescente; Internação; Mortalidade

ABSTRACT

Objective:

to analyze the trend of hospitalization rates and mortality due to Diabetes Mellitus in children and adolescents in Brazil.

Method:

temporal series study, hospitalization rates and diabetes mortality in children and adolescents. Data were obtained from the Hospital Information System and Mortality Information System, from 2005-2015, with analysis performed by polynomial regression modeling.

Results:

87,100 hospitalizations and 1,120 deaths from diabetes were analyzed. Hospitalizations rates increased for both genders and all age groups, with an increase for adolescents aged 10-14 years. The mortality rate declined, except for the 15-19-year age group. In the overall mortality trend in Brazil, the South and Southeast showed a decrease, whereas for hospitalizations only the Center-West remained constant, while the others increased.

Conclusion:

however, there was a decrease in infant mortality and increase in hospitalizations.

Descriptors:
Diabetes Mellitus; Child; Adolescent; Hospitalization; Mortality

RESUMEN

Objetivo:

analizar la tendencia de las tasas de internación y mortalidad por diabetes mellitus en niños y adolescentes en Brasil.

Método:

estudio de series temporales, de las tasas de internación y mortalidad por diabetes en niños y adolescentes. Los datos fueron obtenidos del Sistema de Informaciones Hospitalarias y del Sistema de Información sobre Mortalidad, de 2005-2015, con análisis realizado por el modelado de regresión polinomial.

Resultados:

se analizaron 87.100 internaciones y 1.120 muertes por diabetes. Las tasas de internaciones presentaron aumento para ambos sexos y todas las franjas etarias, con incremento para adolescentes entre 10-14 años. La tasa de mortalidad presentó caída, excepto para el grupo de edad de 15-19 años. A la tendencia de la mortalidad general en Brasil, las regiones Sur y Sudeste presentaron descenso, mientras que para las internaciones, sólo la región Centro-Oeste permaneció constante, mientras que las demás aumentaron.

Conclusión:

ocurrió decrecimiento de la mortalidad en la infancia, sin embargo, con aumento de las internaciones.

Descriptors:
Diabetes Mellitus; Niño; Adolescentes; Hospitalización; Mortalidad

INTRODUÇÃO

O Diabetes Mellitus (DM) é uma doença crônica não transmissível, de evolução progressiva. Considerado um dos maiores problemas de saúde pública no mundo, representa uma das quatro maiores causas de morte por doenças crônicas (1).

Dados da International Diabetes Federation (IDF) confirmam a crescente proporção de pessoas acometidas por DM em grupos etários cada vez mais jovens, sendo a maior parte residente em países em desenvolvimento onde a epidemia tem maior intensidade. Os principais tipos da doença são o Diabetes Mellitus tipo 1 (DM1) e o Diabetes Mellitus tipo 2 (DM2) (1-2).

O DM1 é uma das condições endócrinas e metabólicas mais comuns em crianças e adolescentes, destacando-se as crianças com menos de cinco anos e, principalmente, as residentes em países em desenvolvimento (1,3-5). O DM2 acomete a população em geral, e a sua incidência também tem aumentado entre crianças e adolescentes (1,6-8).

Nas regiões das Américas do Sul e Central, o número estimado de pessoas menores de 20 anos com DM1 é de 118.600. Cerca de 88.300 dessas crianças e adolescentes residem no Brasil, ocorrendo 9.600 novos casos ao ano, tornando-o o terceiro país com maior número de crianças com DM 1 no mundo, atrás apenas dos EUA e da Índia (1). Além disso, o Brasil está entre os 32 países onde há maior risco de desenvolver DM2 (1), sendo necessárias estratégias de controle cuidadosamente planejadas para avaliação e intervenção em saúde (9).

Apesar da atual elevação na incidência do DM em crianças e adolescentes, os dados ainda são limitados para esta população (10-11). Além disso, muitas pessoas permanecem sem diagnóstico por longos períodos de tempo (1,6), o que pode levar a complicações e o agravamento da doença.

O descontrole dos níveis glicêmicos a longo prazo pode desencadear complicações crônicas micro e macrovasculares, levando os pacientes a desenvolverem neuropatias e amputações, retinopatias, nefropatias e doenças cardiovasculares que podem ocorrer após a entrada na puberdade ou após cinco a dez anos do início da doença (12-13). Outras complicações sérias são as hipoglicemias e hiperglicemia grave ou cetoacidose diabética (1,12) que, associados a um controle metabólico deficiente, podem ser a causa das internações hospitalares e mortalidade do paciente com DM (12-14).

Há escassez de estudos que abordam a morbimortalidade de crianças e adolescentes em decorrência do DM (15-16). Desta forma, justifica-se a realização do presente estudo, considerando a importância em se conhecer a ocorrência das hospitalizações e a mortalidade causadas pela doença neste grupo etário.

OBJETIVO

Analisar a tendência das taxas de internação e mortalidade por DM em crianças e adolescentes no Brasil.

MÉTODO

Aspectos éticos

Por se tratarem de dados secundários de domínio público, este estudo recebeu a dispensa da avaliação do Comitê Permanente de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da Universidade Estadual de Maringá, com Parecer de número 01/2018.

Desenho, local do estudo e período

Trata-se de um estudo longitudinal que analisou as séries temporais das internações hospitalares e da mortalidade por DM em crianças e adolescentes no Brasil, grandes regiões brasileiras e capitais dos estados, segundo sexo e idade, no período de 2005 a 2015.

Os dados referentes às internações foram obtidos do Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS) e os óbitos do Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde (SIM/MS), ambos disponíveis no endereço eletrônico do Departamento de Informática do SUS (DATASUS). O levantamento dos dados foi realizado no mês de julho de 2017.

População e critérios de inclusão e exclusão

Foram analisados os dados de internações e óbitos de crianças e adolescentes com idades entre 0 e 19 anos com diagnóstico de DM. A idade máxima adotada para a adolescência foi de até 19 anos, considerando a idade estabelecida pela Organização Mundial da Saúde (17).

O diagnóstico principal de internação e causa básica do óbito relacionado ao DM está codificado segundo normas da Classificação Internacional de Doenças em sua 10ª revisão (CID-10), capítulo IV – Doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas, na categoria E10 a E14 – Diabetes Mellitus (18). As variáveis analisadas foram: idade (0-4; 5-9; 10-14; 15-19 anos), sexo, taxa de internação e taxa de mortalidade.

Protocolo do estudo

Para o cálculo das taxas, as internações foram selecionadas com base no levantamento das Autorizações de Internações Hospitalares (AIH tipo 1), que se referem ao laudo inicial em que o DM apresentou-se como diagnóstico principal da hospitalização, e a mortalidade foi determinada a partir das declarações de óbito com o DM como causa básica do óbito. As taxas de internação e de mortalidade foram calculadas pela razão entre o número de eventos observados e a população de crianças e adolescentes residentes naquele ano e local, segundo sexo, multiplicado por 10.000 habitantes.

Análise dos resultados e estatística

A tendência das taxas de mortalidade e das taxas de internação foi analisada por meio da modelagem de regressão polinomial, em que as taxas foram consideradas como variáveis dependentes (y) e o ano de nascimento como variável independente (x). A variável ‘ano’ foi transformada na variável ano-centralizada (x-2010) e as séries foram suavizadas por meio de média móvel de três pontos. Foram testados os modelos de regressão polinomial linear (y=β0+β1x1), quadrático (y=β0+β1x1+β2x2), e cúbico (y=β0+β1x1+β2x2+β3x3). Considerou-se tendência significativa aquela cujo modelo estimado obteve p valor <0,05. Para a escolha do melhor modelo foi considerada ainda a análise do diagrama de dispersão, do valor do coeficiente de determinação (r2) e análise dos resíduos. Quando todos os critérios eram significativos para mais de um modelo e o coeficiente de determinação era semelhante, optou-se pelo modelo mais simples. As análises foram realizadas por meio do software SPSS, versão 20.1.

RESULTADOS

Foram analisados 1.120 óbitos e 87.100 internações por DM em crianças e adolescentes no Brasil, ocorridos no período de 2005 a 2015. A taxa de mortalidade apresentava-se em 0,21 óbitos por DM por 10.000 habitantes no ano de 2005, mantendo o mesmo valor em 2015. A maior ocorrência de óbitos foi na faixa etária de 15 a 19 anos, que aumentou de 0,43 em 2005 para 0,46 em 2015. A taxa de internação por DM apresentava-se como 10,21 no primeiro ano de estudo, aumentando para 12,44 em 2015, com maior número de internações para a faixa etária de 10 a 14 anos, que aumentou de 13,83 para 18,06, neste mesmo período (Figura 1).

Figura 1
Série histórica das taxas de mortalidade (A) e de internação (B) por Diabetes Mellitus em crianças e adolescentes, segundo faixa etária, 2005 a 2015, Brasil

A análise de regressão polinomial mostrou que houve tendência de queda nas taxas de mortalidade por DM em todos os grupos etários analisados, com exceção da faixa etária de 15 a 19 anos que se manteve constante (p=0,319), porém com o maior valor de taxa média de mortalidade (β0=0,44). Em relação à tendência das taxas de internação, houve aumento em todas as faixas etárias, com destaque para a idade de 10 a 14 anos, que apresentou aumento médio anual de 0,26 (p<0,001; r2=0,85) (Tabela 1).

Tabela 1
Tendência da mortalidade e internação por Diabetes Mellitus em crianças e adolescentes, segundo faixa etária, 2005 a 2015, Brasil

Quando analisada a tendência da mortalidade por DM, segundo sexo e regiões brasileiras, observa-se que houve um decréscimo para o sexo feminino no Brasil (p=0,001) e na região Sul (p=0,006). Já para o sexo masculino, as taxas apresentaram tendência significativa apenas nas regiões Nordeste e Centro-Oeste, que tiveram aumento no início do período estudado, com posterior decréscimo, além de terem os maiores valores de taxa média de mortalidade (β0=0,24 e β0=0,22, respectivamente). A região Sudeste foi a única que apresentou tendência de decréscimo na mortalidade por DM em crianças e adolescentes do sexo masculino, com queda anual média de 0,006 (p=0,001). Vale ressaltar que as taxas médias de mortalidade por DM no sexo feminino foram maiores em todas as regiões, quando comparadas ao sexo masculino (Tabela 2).

Tabela 2
Tendência da mortalidade e internação por Diabetes Mellitus em crianças e adolescentes, segundo sexo, Brasil e grandes regiões, 2005 a 2015

No tocante às internações por DM, segundo sexo, houve tendência de aumento das taxas em quase todas as regiões, com exceção do Centro–Oeste para ambos os sexos e da região Sul para o sexo feminino (p<0,001), que apresentaram decréscimo no final do período. Ressalta-se que as maiores taxas de internação foram para o sexo feminino, com destaque para as regiões Nordeste e Norte, com incremento médio anual de 0,60 (r2=0,99) e de 0,36 (r2=0,77), respectivamente (Tabela 2).

De maneira geral, as taxas de mortalidade apresentaram tendência de queda para as regiões Sul (p=0,007) e Sudeste (p=0,011), e de decréscimo seguido de elevação pouco acentuada para a região Centro-Oeste (p=0,017). Na região Norte, o Acre e o Pará tiveram tendência de decréscimo, sendo que no Pará houve a maior taxa média de mortalidade da região (β0=0,30). Na região Nordeste, destacaram-se o estado de Pernambuco (p=0,013) e Sergipe (p=0,012) com aumento da mortalidade, e o Ceará com queda (-0,009 ao ano; p=0,028). Para a região Sudeste, o Espírito Santo (p=0,019) e o Rio de Janeiro (p=0,002) também apresentaram tendência de queda da mortalidade por DM, e São Paulo destacou-se com a menor taxa média de mortalidade (β0=0,13). Na região Sul, apenas Santa Catarina (p=0,009) apresentou redução, mesmo tendo a segunda menor taxa média do Brasil (β0=0,11; r2=0,65). Na região Centro-Oeste, houve queda da mortalidade no Mato Grosso do Sul (-0,03 ao ano), e elevação no estado do Mato Grosso (0,03) (Tabela 3).

Tabela 3
Tendência da mortalidade por Diabetes Mellitus em crianças e adolescentes, Brasil e capitais de estado, 2005 a 2015

Quanto às séries temporais das taxas de internação por DM, apenas a região Centro-Oeste apresentou tendência constante (p=0,543) em relação à proporção que todas as demais regiões mostraram aumento das taxas, com destaque para a região Nordeste que teve um incremento anual médio de 0,50 (p<0,001). A região Norte exibiu tendência crescente em todos os estados, especialmente em Rondônia (β1=1,10; p=0,002) que também apresentou a maior taxa média de internações da região (β0=12,27). Na região Nordeste, o estado da Paraíba teve o maior aumento anual médio do período (1,17; p<0,001). No Sul do Brasil, somente o Rio Grande do Sul manteve-se constante (p=0,541), enquanto que os demais estados apresentaram elevação das internações. Na região Centro-Oeste, o Mato Grosso do Sul apresentou aumento das internações (0,30; r2=0,91), e os estados do Mato Grosso e Goiás tiveram queda nos últimos anos de estudo. A maior taxa média de internações por DM do Brasil foi no Distrito Federal (β0=29,84) (Tabela 4).

Tabela 4
Tendência da internação por Diabetes Mellitus em crianças e adolescentes, Brasil e capitais de estado, 2005 a 2015

DISCUSSÃO

A abordagem do DM em crianças e adolescentes se faz necessária em função do aumento da incidência e prevalência da doença nesta população, com variações das taxas entre os países e entre populações com condições socioeconômicas distintas, implicando consequências importantes a longo prazo para estes indivíduos e toda a sociedade (6,14).

Os achados do presente estudo identificaram redução das taxas de mortalidade e aumento das taxas de internação por DM em crianças e adolescentes no Brasil, entre 2005 e 2015, com diferenças regionais.

Estudo australiano abordando a mortalidade na população de 1 a 17 anos com DM1, não revelou tendência significativa na mortalidade, devido ao pequeno número de mortes (19). No entanto, embora os estudos sobre mortalidade por DM variem em relação a populações, diagnóstico, períodos, duração do DM e idade no diagnóstico, dificultando a comparação direta dos estudos entre si (20) em um estudo de coorte realizado na Noruega com pacientes com o diagnóstico de início de DM na infância (0-14 anos), em dois períodos de tempo (1999–2012; 1973-1982), também observou-se uma queda na mortalidade pela doença no período mais recente da investigação (20). Da mesma forma, o número total de mortes por DM entre as pessoas dos EUA com idade entre 1 e 19 anos apresentou diminuição entre os períodos estudados (2000–2002 e 2012-2014) (21).

As variações observadas em relação à tendência da mortalidade em crianças e adolescentes por DM nas capitais brasileiras corroboram com parte dos achados de pesquisa que avaliou a mortalidade por DM na população de maneira geral. A avaliação da mortalidade por DM em pessoas com idade inferior a 40 anos, também apontou decréscimo na região Sul e Sudeste. No entanto, houve divergência nos resultados para as regiões Norte e Nordeste, visto que no presente estudo a tendência de mortalidade apresentou-se constante e entre indivíduos mais velhos a tendência de mortalidade foi de aumento (22).

As taxas de mortalidade por DM variam de acordo com as condições socioeconômicas dos países e regiões (14), sendo menores em locais onde a mortalidade infantil tem diminuído e os gastos com a saúde são maiores (12). Contudo, vale ressaltar que em decorrência das dificuldades enfrentadas na detecção da doença, muitas crianças ainda morrem pelo DM, sem que o diagnóstico tenha sido definido (3).

Uma análise da ocorrência do DM1 na infância, em 88 países, apontou para a alta mortalidade pela doença em decorrência de fatores relacionados ao cuidado ineficiente e à dificuldade de acesso aos serviços de saúde (3). Situação semelhante ocorre com as crianças e adolescentes com o tipo 2 da doença, expostos a fatores que contribuem para o desenvolvimento de complicações do DM e que podem levar ao agravamento da doença e à morte, visto que este grupo etário apresenta maior risco se comparado com adultos (7).

No presente estudo, as taxas de mortalidade foram mais elevadas no sexo feminino, e o grupo etário com maior número de óbitos foi o de adolescentes de 15 a 19 anos. Da mesma forma, o estudo australiano constatou que o sexo feminino apresentou maior risco de mortalidade por DM, mas com a maior prevalência de óbitos no grupo etário entre 10 e 14 anos (19).

Em relação às internações, constatou-se tendência de aumento das hospitalizações por DM na infância em todas as regiões do Brasil, em especial em adolescentes de 10 a 14 anos, sendo este aumento observado na maioria das capitais brasileiras. Esses resultados podem estar relacionados a complicações que ocorrem nesta faixa etária pelo descuido com a doença, que é comum entre os adolescentes e pelas características próprias da idade, quando o controle glicêmico tende a ser mais negligenciado (13,23-24). Também pode estar relacionado com a maior incidência de diagnósticos nesta faixa etária, conforme relatado em estudo anterior (25).

O aumento das internações por DM na infância já havia sido constatado em estudo anterior entre crianças menores de cinco anos (26) e também entre a população de 0 a 18 anos (27). A cetoacidose diabética e o estado hiperglicêmico hiperosmolar são as principais complicações agudas graves que podem ocorrer durante a evolução do DM1 e 2, podendo ser responsáveis por grande parte das internações e morte entre crianças e adolescentes (14,27).

Estudo desenvolvido na Itália sobre a tendência das hospitalizações por DM ao longo de dez anos, em todas as faixas etárias, apontou que apesar da diminuição da mortalidade, assim como no presente estudo, também houve um aumento das taxas de internações de pacientes com idade menor ou igual a 19 anos (28).

Quando se faz um paralelo com resultados de hospitalizações em decorrência do DM e o sexo, o presente estudo apresentou elevação das taxas para ambos os sexos, embora nos estados da região Norte e Nordeste as maiores ocorrências tenham sido com pacientes do sexo feminino.

Estudo com pessoas com DM1 e menores de 18 anos encontrou probabilidades mais altas de episódios de cetoacidose diabética para o sexo feminino (29). Os eventos de cetoacidose diabética, que são responsáveis por grande parte das hospitalizações em pacientes com DM, podem ser atribuídos em maior número para o sexo feminino pelo fato de que meninas, durante a puberdade, apresentam maior resistência à insulina (30).

Apesar de ser uma temática relevante e de interesse para a saúde pública, poucas pesquisas brasileiras têm demonstrado o comportamento dos óbitos e internações decorrentes do DM em crianças e adolescentes. Observa-se uma deficiência de dados das taxas de mortalidade da população infantil, principalmente em países menos desenvolvidos (3,15-16,19), e poucos estudos epidemiológicos que avaliem mudanças nas taxas de admissão hospitalar para complicações diabéticas agudas ao longo do tempo e espaço (28).

O aumento de indivíduos cada vez mais jovens sendo diagnosticados com DM a cada ano, convivendo com a doença ao longo da vida, e necessitando de cuidados e controles diários, pode também levar a um acréscimo de intercorrências nos próximos anos (1). Por ser uma das principais doenças crônicas na juventude, a morbidade e a morte prematura de crianças e jovens por DM tem um grande impacto na saúde pública e reduz a expectativa de vida para aqueles afetados em idades mais jovens (31).

Como o desenvolvimento de complicações está relacionado à duração do DM e sua cronicidade, crianças e jovens com a doença representam uma população com alto risco de desenvolver complicações ao longo da vida (1,5). Portanto, destaca-se a importância de reconhecer estas pessoas como uma população vulnerável, além de orientar no reconhecimento da doença, na identificação dos sintomas e proporcionar cuidados voltados à redução dos danos e à prevenção da mortalidade precoce.

Limitações do estudo

O estudo apresenta algumas limitações pela utilização de dados secundários, sujeitos a erros na codificação dos diagnósticos. Também não foi possível identificar situações de internações em decorrência de comorbidades comuns ao DM e os casos de reinternações. Porém, os resultados são válidos considerando-se sua importância para auxiliar os profissionais de saúde na implementação de ações preventivas das complicações do DM comuns em crianças e adolescentes, e que podem desencadear internações e óbitos, muitas vezes evitáveis. Portanto, são necessárias ações de educação em saúde para esta população.

Contribuições para a área da Enfermagem, Saúde ou Política Pública

A contribuição apoiou-se no conhecimento acerca da epidemiologia deste agravo, bem como de sua distribuição por regiões do país, sinalizando para a relevância do DM entre crianças e adolescentes e seus desdobramentos, além de apontar para a necessidade da participação de enfermeiros e gestores no diagnóstico situacional do país e, em especial, para o contexto da sua região, a fim de melhorar o cenário de saúde pública relacionado ao DM infantil.

No contexto da Enfermagem, a investigação deve contribuir para estimular o desenvolvimento de estratégias educativas sobre o tema que envolvam tanto as crianças e adolescentes com DM quanto profissionais de saúde e a população em geral, e contribuam para minimizar os danos provocados pela doença reduzindo complicações que levam à hospitalização e ao óbito precoce desta população.

CONCLUSÃO

O estudo mostrou que as internações por DM em crianças e adolescentes têm aumentado no Brasil nos últimos anos, seguindo a tendência de elevação de sua incidência e das internações no mundo. A faixa etária entre 10-14 anos apresentou maior número de casos de internações, com tendência de elevação. Também foi possível concluir que as regiões Centro-Oeste, Sul e Sudeste são as regiões com maiores taxas médias anuais de internações por DM nessa faixa etária. O estudo confirma, ainda, que embora as taxas de mortalidade das crianças e adolescentes no país tenham se mantido estáveis no período, as maiores prevalências foram em crianças na faixa etária entre 15 e 19 anos, e o sexo feminino apresentou o maior risco de mortalidade.

Assim, os resultados obtidos neste estudo demonstram que o DM em crianças e adolescentes, por seu caráter crônico e pelos danos provocados por dificuldades no gerenciamento da doença ao longo da vida, pode desencadear complicações graves que afetam principalmente os adolescentes, levando a internações e, em alguns casos, à morte.

Estes achados podem contribuir para o planejamento de ações preventivas e educativas para esta população, envolvendo profissionais de saúde, familiares e pacientes, a fim de diminuir os riscos de complicações considerando-se as características da doença crônica e seus desdobramentos ao longo da vida. Além disso, espera-se levantar um alerta para a prevalência e complicações pelo DM em idade precoce em regiões específicas do país.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    Dez 2019

Histórico

  • Recebido
    10 Maio 2018
  • Aceito
    09 Set 2018